Treinadores Brasileiros Têm Papel Importante na História do Futebol Português

Treinadores Brasileiros Têm Papel Importante na História do Futebol Português

Jorge Jesus tornou-se, sem qualquer sombra de dúvida, no primeiro treinador português a ter grande sucesso e a causar impacto no futebol brasileiro. O trabalho realizado à frente do Flamengo, em 2019, deixou marcas profundas e promoveu uma série de debates sobre a principal modalidade desportiva do país.

Estimulado por esta reflexão, no artigo anterior “De Jesus a Joreca. Um Breve Histórico de 12 Treinadores Portugueses que Passaram pelo Futebol Brasileiro”, abordei sobre os treinadores lusos que atuam/atuaram nas terras descobertas por Cabral. Agora, você vai conhecer mais sobre os profissionais que fizeram o caminho inverso: treinadores nascidos no Brasil e que marcaram forte presença em Portugal. 

Seguramente, o de maior impacto foi Otto Glória, que lançou as bases do profissionalismo do futebol português e levou a Seleção Nacional à melhor colocação numa Copa do Mundo, que foi o 3º lugar na 8ª edição da competição, disputada na Inglaterra, em 1966. Mais tarde, Luiz Felipe Scolari, o Felipão, também criou um novo espírito de seleção e levou o país ao quarto lugar na Copa do Mundo de 2006.  

Treinadores brasileiros em Portugal

Otto Glória – Contratado junto ao Vasco da Gama-RJ, tinha apenas 38 anos quando em junho de 1954 cruzou o Oceano Atlântico para revolucionar e iniciar um processo de profissionalização do futebol em Portugal. Logo na chegada introduziu um conjunto de regras que colocaram o Benfica na rota da modernidade. Criou o Lar do Jogador, algo inovador para aquela época. Impôs horários e promoveu a realização de período de concentração antes dos jogos, com normas bastante rígidas. É consensual em Portugal que ele soube equilibrar muito bem a disciplina e a relação de afeto com os jogadores. Até hoje é o treinador com mais jogos pela principal competição do país. Foram 306 jogos treinando por Benfica, Belenenses, Sporting e Porto, clubes pelos quais conquistou cinco campeonatos portugueses (é o maior vencedor da competição) e seis Taças de Portugal. Entretanto, entrou para a história ao levar a Seleção de Eusébio e companhia ao inédito 3º lugar na Copa do Mundo de 1966, na Inglaterra.

Luiz Felipe Scolari – Felipão desembarcou em Portugal em 2003, um ano depois de conquistar a Copa do Mundo com a Seleção Brasileira. O objetivo era claro: vencer a Euro 2004 que se realizaria em Portugal. Não conseguiu. Deixou escapar o título na final, diante da Grécia, no Estádio da Luz. Apesar da desilusão, Scolari continuou no cargo e levou a seleção portuguesa ao quarto lugar no Mundial de 2006, tendo terminado o seu percurso na Euro 2008, após ser eliminado nas quartas-de-final, pela Alemanha. Entretanto, um dos grandes méritos atribuídos a ele foi o fato de ter aproximado a seleção dos torcedores, que andavam um pouco desligados da equipe nacional. Incutiu o hábito das bandeiras à janela em dias de jogos da Seleção. Uniu os torcedores a uma geração fantástica, que esteve no topo das grandes competições.

Dorival Knipel (Iustrich) – Ganhou o apelido de Iustrich por sua semelhança física com Juan Elias Yustrich, famoso goleiro (guarda-redes) argentino, do Boca Juniors-ARG. É provável que seja o treinador brasileiro mais marcante para o FC Porto, pois chegou ao clube em 1955 para colocar ponto final a uma série de 16 anos sem vencer o campeonato nacional. Não só devolveu o título aos Dragões, como também conquistou a Taça de Portugal, naquela que foi a primeira dobradinha do clube. Curiosamente, naquele ano, superou o Benfica do brasileiro Otto Glória. De temperamento explosivo, envolvia-se em constantes atritos com jogadores, colegas, dirigentes e imprensa.

Otto Bumbel – Formado pela Escola de Educação Física do Exército, tinha estilo disciplinador, durão. Treinou o FC Porto por uma temporada e meia, mas o suficiente para ganhar dois títulos. Em 1957/58 ajudou o clube portuense a conquistar a segunda Taça de Portugal da história portista. Na temporada seguinte (1958/59) treinou o Porto nos sete primeiros jogos do campeonato nacional, até ceder o seu lugar a Bela Guttmann, em outubro de 1958. Ainda assim contribuiu para os portistas se sagrarem campeões nacionais naquela temporada. Logo após, treinou times da América Central, como o Saprissa da Costa Rica e, também, a seleção nacional daquele país. Por fim, ficou por quase 20 anos treinando equipes do futebol espanhol, entre elas o Atlético de Madrid, pelo qual foi campeão da Copa do Rei na temporada 1964/1965.

Paulo Amaral – É considerado o pioneiro da preparação física no futebol do Brasil. Foi o primeiro preparador da Seleção Brasileira, nas campanhas vitoriosas das Copas do Mundo de 1958 e 1962 e ainda na edição de 1966. Na temporada de 1971/72 foi convidado a assumir o comando técnico do FC Porto. Entretanto, num período conturbado para os Dragões, com quatro treinadores numa única temporada e quinta colocação no campeonato nacional, teve passagem discreta pelo clube.

Marinho Peres – É, atualmente, o segundo treinador brasileiro com mais jogos na primeira divisão do futebol português, totalizando 222 partidas distribuídas por Vitória de Guimarães, Belenenses, Sporting e Marítimo. A primeira passagem por Portugal se deu aos 40 anos, na temporada 1986/1987, quando chegou para assumir o comando técnico do time de Guimarães. No ano seguinte foi para o Belenenses e, logo na sequência, em 1989, conquistou a Taça de Portugal pela equipe de Belém. Depois disso ficou se alternando entre times do Brasil e de Portugal. Ainda teve uma experiência à frente da Seleção de El Salvador, em 1999, e num time de Angola (ASA), em 2009. O último time que dirigiu foi justamente uma equipe portuguesa: o Belenenses, em 2011.

Paulo Autuori – Entre 1986 e 1995 treinou diversas equipes portuguesas. O primeiro trabalho em terras lusas foi como adjunto de Marinho Peres, aos 30 anos, no Vitória de Guimarães. Depois, nas duas temporadas seguintes firmou-se como treinador principal do Nacional da Ilha da Madeira, onde atingiu a subida da segunda para a primeira divisão. Também na Madeira, foi o primeiro treinador que levou o Club Sport Marítimo a qualificar-se para as competições europeias, em 1994/95, na sua quinta temporada no clube madeirense. No ano seguinte volta ao futebol brasileiro para sagrar-se campeão brasileiro com o Botafogo. Na temporada 1996/97 retorna ao futebol português, desta vez para o Benfica, mas tem passagem discreta, tal como ocorre em 2000/01 quando assume o Vitória de Guimarães. Atualmente é o coordenador técnico do Athletico Paranense.

Abel Braga – De grande prestígio no Brasil, inclusive sendo campeão do Mundial de Clubes com o Internacional, em 2006, Abel Braga notabilizou-se em Portugal por subir equipes menos tradicionais para a primeira divisão do futebol Português. Na temporada de 1985/86, aos 32 anos, recém-graduado em Educação Física, teve breve e infrutífera passagem pelo Rio Ave, equipe do norte do país. Em 1988, ele volta ao Brasil e depois de levar o Internacional ao vice-campeonato brasileiro, retorna a Portugal, para na temporada 1989/90 subir o Famalicão da segunda para a primeira divisão do principal campeonato nacional. Na temporada 1991/92 ele volta a ter êxito ao subir o Belenenses, clube onde ficou por três temporadas. Depois tem rápidas passagens por Famalicão e Rio Ave, clubes que já havia dirigido. Na temporada de 1994/95, realizada sua última passagem pelo futebol português, quando comanda o Vitória de Setúbal.

Carlos Alberto Silva – Foi contratado pelo FC Porto em 1991 para dar continuidade a uma herança pesada de Artur Jorge, treinador português, que na temporada 1986/1987 tinha conquistado a Liga dos Campeões. Entretanto, currículo não lhe faltava. Desembarcou em Portugal poucos anos depois de ter levado a Seleção Brasileira ao ouro nos Jogos Pan-americanos de 1987, em Indianápolis, e à medalha de prata nos Jogos Olímpicos de 1988, em Seul. Carlos Alberto Silva, tantas vezes tratado por CAS, nas duas temporadas em que esteve a serviço dos Dragões acabou por conquistar dois títulos de campeão nacional (1991/92 e 1992/93) e uma supertaça (1992). Foi o último treinador a conquistar títulos importantes em Portugal. Portanto, lá se vão quase 30 anos.

Sebastião Lazaroni – o treinador que dirigiu a Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1990, na Itália, teve uma única passagem pelo futebol português. Esta experiência se deu na temporada 2007/08, na qual levou o Marítimo, da Ilha da Madeira, à quinta colocação no Campeonato Português, classificando a equipe para a Taça UEFA, atual Liga Europa. Naquela oportunidade, o também brasileiro Milton Mendes era o treinador auxiliar.

Milton Mendes – Foi o último treinador brasileiro a trabalhar em Portugal, pelo menos nas três principais divisões do país. Fez sua formação no Vasco da Gama – RJ, mas em 1987, com apenas 22 anos, atravessou o oceano para atuar em terras lusas por cerca de 15 anos. Iniciou a carreira de treinador na temporada de 2002/2003 no pequeno Machico, da Ilha da Madeira. Trabalhou em times da ilha por cinco temporadas, onde constituiu família e viu nascer os filhos. Depois, solidificou seu percurso como treinador no Catar, no Japão e no Brasil, onde dirigiu Vasco, Athletico Paranaense e Sport, entre outros. Após 15 anos fora de Portugal, retornou para “casa”. Em dezembro de 2020 assumiu o time principal do Marítimo e fez história ao eliminar o Sporting da Taça de Portugal. A equipe Sportinguista é atual líder invicta do Campeonato Português com 20 vitórias e apenas quatro empates. Entretanto, em março de 2021, após oito jogos sem vitória, pediu demissão do cargo. Atualmente está sem clube.

Como podemos observar, ao longo de quase sete décadas, os treinadores brasileiros marcaram importante presença no futebol português, com contributos importantes para a profissionalização da modalidade no país, com quebra de paradigmas na relação entre comandantes e comandados e até mesmo levando a seleção nacional às melhores colocações da história.

Portanto, com a chegada recente de treinadores portugueses ao Brasil, começamos a construir uma relação com contribuições de ambas as partes. Eu entendo que o intercâmbio é extremamente válido e benéfico, pois promove a troca de conhecimentos entre estilos e métodos diferentes aplicados no futebol. Todos têm a ganhar. Entretanto, penso que a competência não tem nacionalidade. Independentemente da origem dos profissionais é preciso ter qualidade (no próprio treinador, na comissão técnica e no grupo de jogadores). Ninguém faz milagres, seja brasileiro, português ou de qualquer outra nacionalidade. Reitero, é preciso ter qualidade e planejamento.

Luciano Gasparini Morais

Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos/RS (Brasil)

Pós-Graduado em Gestão Desportiva na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (Portugal)

Ex-árbitro da Federação Gaúcha de Futsal (Brasil)

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