Pandemia coloca em risco o futebol de formação em Portugal
O desporto é, sem dúvida alguma, um dos maiores elementos de integração social do mundo, especialmente o de modalidades coletivas. O futebol, por exemplo, é o mais praticado e assistido em todo o Planeta. Ele tem penetração transversal, linguagem universal e une povos. Imagina o poder que isso tem em nações como Brasil e Portugal, onde a paixão por esta modalidade é altamente exacerbada.
Muitas crianças brasileiras que chegam a Portugal são inseridas social e culturalmente através da escola, mas, também, pelo viés da prática desportiva, predominantemente pelo futebol. O futebol é lazer, mas também proporciona saúde, bem-estar, traz qualidade de vida, disciplina, educa e socializa. Portanto, entender o desporto como fator essencial neste contexto de reinserção social em fase de transição na vida de crianças e jovens é tema bastante pertinente para as famílias que encaram o desafio de recomeçar a vida fora do país de origem.
Por incrível que pareça, dadas as dimensões populacionais, Portugal tem muito mais clubes e atletas federados que o Brasil. Isso oferece garantias de que, facilmente, as crianças vão encontrar clubes de futebol para se inserirem. Independentemente das valências técnicas que possuem, há equipes para todos os gostos e níveis: para os mais competentes, para os menos competentes, para os mais competitivos e para os menos competitivos.
Entretanto, a temporada desportiva que normalmente começa entre a segunda quinzena de setembro e a primeira de outubro vive momento de alta indefinição, o que tem causado aflição em praticamente todos os intervenientes do futebol de formação, quer sejam eles dirigentes, treinadores, funcionários, pais, atletas, árbitros, entre outros não menos importantes.
Por conta da situação pandêmica mundial provocada pela Covid-19, a partir de 10 de março, atendendo regulamentações da Direção-Geral da Saúde (DGS), Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e associações distritais (equivalentes às federações estaduais no Brasil), todos os clubes tiveram as suas atividades encerradas, relativamente aos escalões de formação (categorias de base).
Passados seis meses, ainda não há calendarização para o recomeço de treinos sem restrições para o futebol de formação. Além do negativo impacto econômico que isso vem causando nos clubes, traz enormes danos físicos e psicológicos aos jovens, que estão alijados da prática desportiva em contexto competitivo.
No dia 9 de setembro, Pedro Sequeira, presidente da Confederação dos Treinadores de Portugal, reuniu-se com membros da DGS e da Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto (SEJD), para juntos debaterem esta importante questão. Sequeira saiu otimista do encontro ao afirmar que vê “boas perspetivas para o regresso do desporto de formação, ainda em outubro”.
A abertura do ano escolar no sistema público, em meados de setembro, mobiliza cerca de 1,2 milhão de alunos e 120 mil professores. Certamente, a DGS está aguardando para ver como o vírus vai se comportar neste novo e faseado cenário.
No entanto, enquanto não se parte para decisões concretas na área do desporto, sobretudo na formação, abre-se espaço para as polêmicas. Há aqueles que já colocam em causa os (des)critérios governamentais quando se permite festas de partidos políticos com mais de 15 mil pessoas, públicos em teatros abarrotados e espectadores em touradas. Para engrossar esta lista de incongruências, já foram vendidos quase 100 mil bilhetes para as etapas dos mundiais de Fórmula 1 e de Motovelocidade, em Portimão (Portugal), em Outubro e Novembro, respetivamente.
Enquanto aguardamos por novas análises e decisões, o certo é que a socialização e a prática da atividade física através do desporto de formação ficam altamente prejudicadas. Já há muitos atletas que desistem do desporto, pois acham enfadonho apenas treinar com uma imensa lista de restrições. E o que é pior, sem perspetivas de retomada da “normalidade” e das competições.
Luciano Gasparini Morais
Ex-árbitro da Federação Gaúcha de Futsal
Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos/RS (Brasil)
Pós-Graduado em Gestão Desportiva na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto(Portugal)